sábado, 31 de dezembro de 2011

Um Natal diferente ( do livro "Também eu estive lá...")

Só quem está fora da mãe-pátria pode avaliar, por si, o quão custoso é passar esta época festiva longe do seus familiares e amigos; que o digam os nossos emigrantes e todos aqueles que nas mais diversas circunstâncias, algum dia, tiveram de o vivenciar.
Tentando colmatar, de alguma forma, a reunião à volta de cada uma das nossas famílias na metrópole, nesta noite de 1972, também a família da ÔNZIMA se reuniu para a comemorar.
O rancho foi melhorado com uma pacaça que o capitão e os alferes Nunes e Coelho tinham abatido; as grades de cerveja foram duplicadas, bem como o bacalhau; o whisky foi distribuído pelo pessoal; o vago mestre teve que passar diplomas suplementares a outros cozinheiros improvisados e que queriam também demonstrar os seus dotes culinários, disputando especialidades à Savoy; enfeites vários e velas de ocasião davam o ambiente próprio àquela noite  festiva, onde aqui e ali a saudade era disfarçada por alguma lágrima de ocasião.
Já algo "regados", a ocasião proporcionava-se para uma Parada de Estrelas improvisada. O furriel Lopes, um alfacinha de gema, deu o mote, com uns faditos castiços, corridos ou da Mouraria  logo se fazendo coro no trautear da letra. No prosseguimento, o furriel Cunha  (de saudosa memória), perito em canções de intervenção, ripostaria com o Pedro Soldado de Manuel Alegre e Adriano Correia de Oliveira, logo sequenciado pelo Lá longe onde o sol castiga mais, de Paco Bandeira.
Entre brindes e abraços de confraternização e onde as patentes militares, por um dia, se misturavam à mesa, o alferes Coelho começou a trautear o fado coimbrão da Samaritana, provocando um brilhozinho lacrimejante nos olhos de muitos de nós.
A noite não ficaria completa se os meus camacheiros, liderados pelo Emanuel e logo acompanhados pelo "Caganeira", vestidos a rigor com umas toalhas de ocasião e logo seguidas de "damas" improvisadas, não rematassem com o Bailinho da Madeira, pondo toda a Companhia a dançar e apressando a digestão.
Este nosso amigo também não se fez rogado e lá se foi revezando na viola e no acordeão, ajudado por um sexteto rítmico no matraquear dos talheres nos copos.
Já a noite ia alta e ainda ecoavam nos ouvidos as últimas estrofes do nosso Malhão.
Era hora do descanso do guerreiro e, nessa noite, até o corneteiro teve de fazer horas extras.
Foi o Natal de 1972 no nosso aquartelamento do Songo, Norte de Angola.

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