terça-feira, 29 de setembro de 2015

Cap. 3 - Os primeiros dias no quartel


Cap. 3

 Os primeiros dias no quartel

No dia seguinte e após vista grossa do sargento de manutenção ao meu físico empacotado nos seus 49 quilitos, foram-me distribuídos os uniformes nºs 2 e 3 para usar na instrução (o nº 1, facultativo, era o uniforme de gala, a expensas nossas) constituídos, respectivamente, por números de pares de calças, camisas, blusões, quico e boina, botas de lona e cabedal, cantil, marmita e a espingarda em uso na altura, a G 3, além de outros apetrechos indispensáveis à instrução. Surpreso fiquei quando o sargento me preveniu que teria de entregar tudo no fim da recruta!...

Experimentando os novos fatos-macacos, de cor verde-garrafa, quase me senti um astronauta, pois parecia navegar no espaço, tal o desperdício de fazenda para um somático tão franzino e cuja pele até tentava emigrar do corpo por ter vergonha de aí ficar embrulhada. Logo, fui reclamar outro fardamento, pois no distribuído caberiam não um Rei [1] mas quase toda a família real junta, já para não falar das botonas tão largas e compridas que os dedos dos pés se afligiam com tanto estacionamento! Em resposta, só ouvi um grunhir do sargento, cuspindo de asneiras o cabo da arrecadação para que se despachasse com mais fatos-macacos, e de que “não havia mais trocas e que as fatiotas iriam ao sítio logo que visitasse a Lagoa” – mais tarde, havia de perceber a graçola e dar-lhe razão. Lá me consolei quando na formatura de apresentação na parada, reparei no cadete [2] Carapeto, espremido dentro da farda e rebentando pelas costuras no seu enchido de peso-pesado, e o Sousa que mais parecia ressuscitado da lavandaria, minguado em calças uns 20 cm para os seus 1,90 de altura!...

Entretanto, adaptados os ossos e a mente à nova realidade, foi tempo do primeiro susto. Nesse primeiro dia, enquanto decorria a instrução e ficávamos a saber os nossos lugares no pelotão e os respectivos comandantes, eis que surge em plena parada uma ambulância militar transportando dois cadetes feridos, do 2º turno de instrução, e que quase “batiam a bota” nos exercícios da lagoa pois não tinham aguentado a pressão!

 

 



[1]  No serviço militar somos reconhecidos pelos nossos apelidos.
[2]  Instruendo a oficial.
 
 
 
 
 
 
 

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